Apagando a Corrupção (ou boa parte dela):

Triângulo do Fogo

O triângulo do fogo é composto por três elementos: combustível, temperatura de ignição e o oxigênio do ar atmosférico (comburente). Sem que eles estejam combinados, não há combustão, e não há fogo. Lembrei-me disso ontem (16/06), assistindo ao Jornal Nacional, durante a exibição de um dos depoimentos prestados por Sérgio Machado, ex-diretor da Transpetro, em sede de delação premiada. Ele descreveu como funcionava o esquema de corrupção na subsidiária da Petrobrás, alegando, ainda (e ninguém duvida), que o mesmo ocorre, invariavelmente, em toda a administração pública indireta – notadamente em empresas públicas e sociedades de economia mista. Basicamente, empresas estatais, políticos ímprobos e empresários desonestos compõe o “triângulo da patifaria”.

Machado - Estatais - Esquema

 Ora, se é possível extinguir o fogo anulando um dos três elementos do triângulo, então por que não podemos interromper, seguindo a mesma lógica, o fluxo de dinheiro público surrupiado por meio das estatais, eliminando o primeiro vértice desse esquema espúrio – no caso, privatizando esses verdadeiros vertedouros de dinheiro dos pagadores de tributos?

Já passou da hora de o Estado brasileiro concentra-se nas atividades para as quais ele foi concebido, e deixar de lado essa obsessão de bancar o empresário (corrupto). Empresas privadas há décadas já deram-se conta de que deveriam delegar a terceiros as atividades não correlacionadas diretamente com o processo produtivo, tais quais vigilância, higienização, manutenção, dentre outras tantas. Calibrar o foco é medida indispensável na busca pela eficiência – essa eterna preterida pelo poder público. Quando o Estado chama para si a incumbência de prestar diretamente tantos serviços à população, não consegue canalizar suas energias para as tarefas primordiais, como, mormente, a segurança pública.

Por certo, uma zona de incerteza sempre é gerada neste debate: o que devemos considerar como atividades hoje desempenhadas pelo Estado passíveis de concessão a particulares? Surgem então casos em que não resta claro se a administração pública deve manter o controle daquela atividade ou privatizá-la. Educação e Saúde, por exemplo, devem continuar sendo providas pelo método atual (com resultados pífios e muita verba desviada), ou o Estado deveria limitar-se a financiar o atendimento dos cidadãos em instituições privadas do ramo?

Mais certo ainda, porém, é que entregar correspondências, prospectar e refinar petróleo não estão neste rol de imprecisão. Mesmo com o monopólio (artificial) legal da entrega de cartas, a estatal ECT conseguiu a façanha de produzir R$ 2,1 bilhões de prejuízo somente em 2015 – para não mencionar aqui o rombo no fundo de pensão dos funcionários do correios, o Postalis. Não seria bem melhor, no dia em que eu decidisse enviar um pacote via postal, poder escolher entre meia dúzia de empresas que estivessem concorrendo umas com as outras?

Já a Petrobrás… Bom, aí é covardia. Limito-me, apenas, a recomendar a leitura do relatório da auditoria realizada pela empresa McKinsey na estatal, apresentado em outubro de 2015. Seguem alguns trechos que destacam práticas que corroeram a gigante idealizada pelo ditador Vargas:

– Casos de corrupção na alta gerência da empresa;

– Constante aumento de custos de pessoal;

– Promoções sem mérito;

– Elevada burocracia e baixa visão de resultados;

– Um dos fatores mais daninhos para a empresa foi a bandeira do conteúdo local, que só aumentou os custos (e a roubalheira) e diminuiu a qualidade;

– Média de duração de projetos de construção de FPSOs (plataformas) no Brasil 68% maior do que a média internacional;

– Para construções de FPSO, os custos da Petrobras alcançam 350% dos de outras companhias;

– A Petrobras possui 1.515 pedidos de patente no mundo; A Shell Group possui mais de 16.000, a Total mais de 9.600 e a Chevron mais de 8.300 pedidos;

– O atraso médio da construção nos estaleiros é de 12 meses;

– Estaleiros locais possuem pouca experiência na construção de sondas e FPSOs. Experiência em construção de cascos muito limitada.

Fonte: http://www.oantagonista.com/posts/como-o-pt-quebrou-a-petrobras

O famigerado “capitalismo de compadrio”, pormenorizado pelo compadre Sérgio Machado (após perceber que até seu filho seria encarcerado), é o único beneficiado por este status quo. Pergunte para dirigentes da Odebrecht e das demais empresas envolvidas no escândalo do Petrolão, e descubra se eles preferem a Petrobrás estatal ou privatizada. Ou, quem sabe, questione se eles preferem ser “coagidos” a pagar propina para agentes públicos, ou competir de forma idônea com outras empresas no mercado, buscando oferecer melhores e mais baratos serviços. Bom, tanto faz: é a mesma pergunta, na verdade.

O grande empecilho para as privatizações e concessões é, sem dúvida, a percepção geral de que estas consubstanciam verdadeiras doações do patrimônio público. Será mesmo tão ruim assim livrar-se de ativos deficitários e que servem somente para canalizar nossas riquezas para bolsos de gente sem escrúpulos e para campanhas eleitorais? Será que o Estado brasileiro fabricava aeronaves e extraía minérios melhor do que fazem a Embraer e a Vale? Ou talvez devêssemos comparar o setor de telefonia antes e depois da privatização… Mas daí seria outra covardia, e das grandes.

E olhe que não estamos ainda abordando outras gigantes estatais como a Eletrobrás, cujo balanço financeiro a KPMG, empresa de auditoria, se recusa a assinar porque ele não mensura o dano causado à estatal por irregularidades investigadas pela Lava Jato. Há muitos outros “incêndios” esperando para serem apagados nas mais de 100 estatais brasileiras – considerando tão somente a esfera federal.

Neste nefasto triângulo formado por políticos, empresários e estatais, os dois primeiros vértices já estão tendo suas arestas devidamente aparadas pela Lava jato. Mas isso é como enxugar gelo: sempre haverá  malandros dispostos a aparelhar e solapar o patrimônio nacional. Por que não retirar, portanto, o “combustível” dessa relação explosiva – com o perdão do trocadilho – deixando a ver navios (sonda) os próximos matreiros que pretendiam usar a Petrobrás para enriquecer (mais)?

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4 comentários sobre “Apagando a Corrupção (ou boa parte dela):

  1. Essa gente da esquerda – e falo apenas dos ingênuos e bem-intencionados, pois os outros dispensam comentários – está sempre esperando que a próxima administração da estatal (genericamente falando) será honesta e competente. Quando se tenta criar mecanismos para mitigar o problema [de desonestidade e incompetência], logo aparece alguém para dizer que estão tentando privatizá-la – antes fosse. O caso da Lei das estatais que estão tentando aprovar agora mostra bem isso. PSOL, PT e assemelhados estão acusando os propositores de tentarem uma privatização branca.

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  2. A esquerda, no fundo, (re)conhece o problema apontado por você, Bordin. Mas impera entre eles a importância da Narrativa, da causa em detrimento das pessoas comuns. Em termos racionais, jamais poderiam questionar seus argumentos. Mas a dialética marxista não opera assim. Nem o cérebro da zumbilândia.

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    1. Alexandre, foi interessante você mencionar a supremacia dos argumentos liberais sobre a esquerda: por que ela continua cooptando tanta gente então? Vejam o que escreveu Rodrigo Constantino ontem:
      ” A falha dos liberais não foi tanto em não mostrar o fracasso empírico ou teórico do socialismo. Isso fizemos, e muito. Preciso citar Böhm-Bawerk, Mises, Hayek, os austríacos? Ou tantos livros e estudos sobre o caos produzido pela coletivização das propriedades, o planejamento central, o excesso de intervencionismo? Creio que não. Eis a real falha dos liberais, em minha opinião: conquistar os corações das pessoas, não só as mentes. Por termos a razão e a história do nosso lado, costumamos relaxar quanto às emoções. Mas pessoas são seduzidas por ideologias ou doutrinas com base nelas também. No caso dos esquerdistas, só nelas. Segundo Böhm-Bawerk, “as massas não buscam a reflexão crítica: simplesmente, seguem suas próprias emoções”. Acreditam na teoria marxista de exploração porque a teoria lhes agrada. O economista conclui: “Acreditariam nela mesmo que sua fundamentação fosse ainda pior do que é”. Infelizmente, não adianta apenas mostrar o fracasso socialista. É preciso chegar ao coração das pessoas, cativar. Não foi o departamento teórico ou empírico dos liberais que fracassou; foi o de marketing.”
      Por Rodrigo Constantino

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      1. Sim, acho que ele está certo. O Pondé aborda o mesmo ponto, mas por outro ângulo: “a esquerda conseguiu convencer o mundo de que eles, e só eles, são humanistas”.

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